230%! Este foi o aumento do preço dos Direitos de Emissão de CO2 (EUA para Dez-21) desde o confinamento de Março de 2020, devido à pandemia COVID-19. Mesmo ignorando este evento, este mercado subiu de 25 €/tonelada para 51 €/tonelada, duplicando o seu valor em menos de um ano.

Figura 1 – EUAs Y+1. FONTE: MTECH
A tendência atual recebe dois tipos de reações: por um lado, alguns celebraram-na defendendo que simboliza a “motivação” necessária para as empresas acelerarem a sua descarbonização; Por outro, ouvem-se vozes de preocupação devido ao impacto deste custo extra na rentabilidade e competitividade dos seus negócios.
Na esfera política, a Comissão Europeia apoia a tendência atual, afirmando que não pretende “intervir” para a estabilizar a subida de preços, enquanto alguns governos apresentam-se afligidos com os prejuízos económicos devido à pressão adicional sobre a indústria, bem como ao risco da “fuga de carbono”.
Apesar dos sentimentos contraditórios, a dura verdade é que os preços do carbono (EUAs) terão que subir para acelerar a descarbonização de forma a cumprir o objetivo da U.E. de se tornar Net Zero até 2050.
Mas está a funcionar?
O Regime de Comércio de Licenças de Emissão da União Europeia (ETS do inglés Emission Trading Scheme) é o maior regime multinação de comércio de emissões do mundo e é um dos pilares da política da União Europeia para combater as alterações climáticas e atingir os objetivos do Green Deal definidos. O sistema representa 40% das emissões totais na U.E. provenientes de centrais elétricas, de centrais industriais e de companhias aéreas que operam dentro da Europa.
Dados oficiais da Agência Europeia do Ambiente (EEA) confirmaram que em 2019, houve uma redução das emissões de Gases de Efeito de Estufa (GEE) em 24% abaixo dos níveis de 1990, com quase 80% dessa redução a ser verificada no setor do da energia (Heat and power). Os dados preliminares apontam para uma nova redução em 2020, principalmente devido à menor procura de energia e à menor utilização do carvão. Os números abaixo mostram que o ETS está a funcionar, uma vez que o sector da energia e do calor é o único que não tem a atribuição gratuita de EUAs, pelo que o impacto dos preços do carbono é maior.
O regime de comércio de licenças de emissão (ETS), também conhecido como limite máximo e comércio, é uma abordagem baseada no mercado para controlar a poluição, proporcionando incentivos económicos para a redução das emissões de poluentes.
Uma autoridade central, normalmente uma entidade governamental, atribui ou vende um número limitado de autorizações que permitem a descarga de uma quantidade específica de um poluente específico durante um determinado período de tempo. Os poluidores são obrigados a deter licenças em montante igual às suas emissões. Os poluidores que querem aumentar as suas emissões devem comprar licenças a outros que estejam dispostos a vendê-las.
O ETS da U.E. está neste momento na Fase 4 que decorrerá entre 2021 e 2030.

Figura 2: Emissões UE-ETS. FONTE: Refinitiv
O ETS é uma das pedras angulares do Green Deal da U.E.
No dia 11 de Dezembro de 2019, Ursula Von der Leyen anunciou o Green Deal da E.U., um conjunto de políticas e estratégias desenvolvidas para combater as alterações climáticas, de uma forma economicamente e socialmente sustentável. A meta ambiciosa em termos de redução de emissões de GEE foi definida, baixando dos 40% para os 55% (dos níveis de 1990) até 2030 e 100% até 2050 (Net Zero).
Para atingir um objetivo tão ambicioso, a União Europeia baseia uma parte importante da estratégia no sucesso do mercado ETS da UE, acreditando que uma abordagem de base de mercado é a forma mais transparente de incentivar a adoção de soluções mais amigas do ambiente.
A nova meta definida levou à necessidade de ajustar o atual pacote da Fase 4 e a primeira discussão preliminar oficial sobre os ajustamentos teve lugar na Reunião Especial do Conselho Europeu no passado mês de Maio (dias 24 e 25), em Bruxelas, onde o pacote “Fit for 55” foi revelado antes da votação final agendada para julho.
Nessa sessão, foram fortemente discutidos três pontos principais:
- A C.E. propôs um novo regime de comércio de emissões apenas para o transporte rodoviário e para os edifícios, excluindo-os do atual regulamento de repartição dos esforços da UE (EFR)
- O mecanismo de Ajuste Transfronteiriço de carbono, ou carbon boarder adjustment mechanism (CBAM)
- Fim das licenças de carbono gratuitas para a indústria intensiva
O primeiro ponto suscitou preocupações sobre a riqueza e as desigualdades sociais, uma vez que a criação desse mercado esperaria ter um impacto direto nos automóveis a gasóleo e nos sistemas de aquecimento domésticos. Espera-se que as famílias de baixos rendimentos sejam as que acabam por sofrer devido à falta de capacidade de mudarfacilmente para soluções mais ambientais. As expectativas apontam para um preço mais baixo em comparação com o atual mercado de ETS, mas, mesmo assim, deverá seguir a mesma tendência bullish, a fim de impulsionar a transição energética.
O próximo ponto discutido foi o CBAM, um mecanismo destinado a garantir que as importações de indústrias com grande intensidade de carbono provenientes de países terceiros, que não têm obrigações ambientais tão rigorosas como a U.E., paguem um montante semelhante ao preço do carbono da UE. Este mecanismo é crucial para reduzir o risco de “fuga de carbono”, tornando a indústria europeia competitiva, ao mesmo tempo que cumpre as metas climáticas da União Europeia, no entanto, preocupações importantes em torno de possíveis guerras comerciais e de risco para as indústrias europeias que precisem de importar matérias-primas, que não existam dentro do espaço comunitário.
Alinhadas com o ponto anterior, as orientações da UE sugerem que a aplicação do CBAM significaria o fim da alocação gratuita de direitos de emissão (EUAs) para a indústria pesada europeia, o que poderia ser impactante no caso de competir com outras regiões sem políticas ambientais tão rigorosas.
Outros regimes de comércio de licenças de emissão
Atualmente, existem alguns regimes de comércio de licenças de emissão para além do ETS da UE, sendo o mais recente o do Reino Unido, que começou o seu funcionamento no passado mês de Maio e que funciona de forma semelhante ao da EU. Este ano, a China também iniciou o seu sistema de Direitos de Emissão, que representa 30% das emissões totais chinesas, tornando-se no maior mercado de carbono do mundo.
Existem também mercados de ETS semelhantes na América do Norte, com um que liga a Califórnia (EUA) ao Quebec (Canadá) e outros estados que têm os seus próprios mercados de ETS. No ano passado, o México colocou em prática o seu piloto e espera-se que este ano passe para a fase 1.
Na Ásia, o Governo Metropolitano de Tóquio e a Prefeitura de Saitama estão integrados num mercado conjunto de limites e comércio desde 2011 como um esquema nacional no Japão. A Coreia do Sul também implementou o seu mercado de ETS em 2015 e cobre 70% das emissões nacionais de GEE provenientes de indústrias e edifícios. Encontra-se atualmente na terceira fase (2021-2026).
Na Europa, a Suíça também tem o seu próprio mercado ETS mas o mesmo foi interligado com EU-ETS em janeiro de 2020.
Existem outros sete países, como a Colômbia, a Índia e o Chile e 8 Estados dos EUA que têm legislação em estudo ou estão a desenvolvê-la ativamente, a fim de lançarem os seus mercados de ETS.

Figura 3 – Regimes de Comércio de Licenças de Emissão em Todo o Mundo. FONTE: Climate Policy Info Hub
Consumidores finais
Os preços do carbono (EUAs) têm um impacto direto nos preços da eletricidade, uma vez que os produtores de energia são obrigados a comprar licenças de emissão por cada tonelada de CO2 emitida proveniente da queima de carvão ou de gás natural para gerar eletricidade. O preço do carbono tem um impacto entre 25% e 60% dos preços da energia espanhola, dependendo da participação dos combustíveis fósseis no mix energético. Este facto é uma das principais razões pela atual volatilidade do mercado e os níveis de preços no mercado OMIE.
Para além do custo da eletricidade, espera-se que os custos do gás natural e dos combustíveis fósseis sejam ainda mais pressionados nos próximos anos, afetando enormemente as indústrias e as famílias, não só pelo “preço das matérias-primas”, mas também pelos impostos adicionais que poderão ser aplicados pelos governos através do ERF.
O pacote “Fit for 55” poderá trazer mais clareza sobre a velocidade da subida dos preços do carbono para os próximos meses (e anos), com as projeções atuais de diferentes fontes a apontarem para variações entre os 80 e os 180 €/tonelada até 2030.
Ainda não é claro qual será o pacote final que a União Europeia decidirá aplicar mas é importante que consiga equilibrar a urgência de cumprir os objetivos ambientais definidos e garantir uma transição justa e equilibrada.